Romeu e Julieta

Por Alex Ribeiro

Romeu e Julieta é uma aclamada peça de William Shakespeare, escrita por volta de 1594. Sendo encenada por todo o mundo, ao longo de quatro séculos, a peça transformou seus dois protagonistas no casal mais famoso da literatura ocidental. Referenciados pelo amor e pela paixão que dedicam um ao outro, Romeu e Julieta são citados em poesias, músicas e no cinema, deixando de ser apenas um casal do universo teatral de Shakespeare, para se tornarem um símbolo pop. As cenas em que os dois revelam seu amor, na janela de Julieta, se tornaram o clichê do casal enamorado. Várias são as obras que revelam, sob a luz do luar, um casal tão apaixonado, onde ela, na sacada de sua janela, ouve as doces e poéticas palavras do seu amor. Até mesmo na bela peça de Edmond Rostand, Cyrano de Bergerac, temos uma citação da cena shakespeariana, porém, vale lembrar, com um requinte de dor do fantástico Cyrano descrevendo seu amor platônico por Roxana. Mas a peça é muito mais que um casal apaixonado querendo viver o seu romance. Acontecida em Verona, a peça Romeu e Julieta traz na sua carpintaria dramática um moinho de tensões, alimentadas por uma rixa entre duas poderosas famílias do lugar, os Montecchio e os Capuleto. Esse conflito entre as duas famílias é o motor trágico da peça. Se por um lado temos a tensão violenta causada pelas brigas e assassinatos entre as duas facções, por outro, temos a tensão da paixão proibida, que se desespera por consumir-se. O cenário está desenhado. Na espera ansiosa pela tragédia.

Julieta tem aproximadamente quatorze anos quando conhece Romeu, numa festa que seu pai oferece em sua casa. Ele, mascarado para não ser reconhecido na casa da família rival, está à procura de Rosalinda, por quem está apaixonado. E na procura da sua dama, ele encontra a outra, e se vê por ela perdidamente apaixonado. Mais uma paixão à vista. Julieta também se apaixona pelo intruso, e a ânsia de ficarem juntos faz com que o casal queira se consumir nesta paixão. Porém, Teobaldo, primo de Julieta, reconhece Romeu e não se contenta em vê-lo impune, em sua casa. Irá, em breve, buscar vingança.

No dia seguinte, com a ajuda do Frei Lourenço e da Ama, Julieta e Romeu se casam em segredo e planejam viver juntos, mesmo que suas famílias sejam inimigas. Mas, naquele mesmo dia, numa rua de Verona, Teobaldo está à procura de Romeu para se vingar. E querendo evitar a briga, nosso protagonista insiste que partam e esqueçam a contenda. Teobaldo, ainda tomado de ira, fere de morte Mercúcio, amigo de Romeu. Tendo o amigo morto por sua causa, nosso apaixonado herói deita espada sobre o primo de sua noiva. Duas mortes. O sangue nas ruas de Verona faz com que o Príncipe dê um veredito que deixará o casal imerso em sofrimento profundo. Romeu é desterrado.

Julieta, que soubera há pouco tempo que terá de se casar com Páris, um importante duque, vê seu sofrimento aumentado ao saber da morte de seu primo Teobaldo, e ainda mais, por saber que seu amado fora desterrado justamente por cometer esse crime. A dor parece insuportável. Ela vai até o Frei e pede auxílio. O religioso resolve ajudar o jovem casal, e cria um plano. O plano que porá tudo a perder. Julieta há de beber uma poção que a deixará como morta e, após ser velada, passados dois dias, poderá sair do mausoléu e fugir para os braços do seu Romeu. Enquanto isso, ele envia uma carta para Romeu relatando os detalhes do seu plano. A carta não chega, e a tragédia se dá. Nosso casal morre de amores.

Talvez Shakespeare quisesse mostrar o poder avassalador das paixões, e mais, que o amor não vai pedir endereço para se manifestar. O certo é que o amor de Romeu e Julieta tem algo de muito humano. Paixões avassaladoras não são raridade, mesmo que se passem muitos séculos, haverá sempre uma identificação com o amor dos dois jovens. Talvez por isso nosso casal seja tão famoso. A maioria dos personagens de Shakespeare nos dão essa possibilidade de identificação. Servem-nos de espelho para que possamos enxergar nosso mais profundo humano, nossas paixões, nossos equívocos, e até mesmo nossa maldade. A obra de Shakespeare é atemporal por trazer justamente essa profundeza humana. É um convite para adentrarmos em nossos labirintos e nos reconhecermos. E um desafio para os muitos intérpretes que têm como missão levar a trama e os personagens aos espectadores. Romeu e Julieta, portanto, são a síntese de nós mesmos.

Mas poderíamos nos servir de outra reflexão, aquela que leva à tragédia. Vale lembrar o que aconteceu com as duas facções, que se batem, que se destroem e que acabam por perder seus bens mais valiosos, os filhos. Já há alguns anos temos visto que o Brasil vai se acirrando numa divisão quase que nos moldes Capuletos e Montecchios. Porém, assim como em Shakespeare, esta cisão tem causado enormes danos. Há aqueles que usam desse acirramento para chegarem ao poder e nele se manterem. Eles estão com as garras e os dentes de fora, alimentando-se desta rixa que nos divide já há algum tempo. Será que vai ser preciso uma tragédia para que possamos ter uma trégua?

A verdade é que a tragédia já está aí, sendo servida a conta gotas.

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Autor: Alex Ribeiro

Ator da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto, psicólogo, poeta.

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