Publicado em Categorias Cultura, Literatura, Poesia

Por Jackson Melo

Vejo casais felizes
De mãos dadas
Sorrisos enamorados
Planos infinitos
Regados de amor

Vejo olhares apaixonados
Sorrisos que descrevem frases
Almas que se entrelaçam
Juntando corações

E vejo eu e você
Amando juntos
Mas separados
Um amor compartilhado
Dois apaixonados distantes

Condenados
A sofrer pelo amor
O mesmo que acalenta
Se faz carrasco
Voraz e impiedoso

Amor impossível
É o que dizem…
Mas pra nós
Tortura sem fim

A espera?
Acordar um dia
Soltos das algemas
Livres para amar
Viver o tempo que nos resta
Unidos pela paixão.

Publicado em Categorias Cultura, Literatura, Resenhas, Teatro

Por Alex Ribeiro

O Arquiteto e o Imperador da Assíria é uma peça do dramaturgo espanhol Fernando Arrabal, que foi encenada no Brasil, pela primeira vez, em 1970. Conta a história da convivência de dois homens bem diferentes. O arquiteto, único habitante de uma ilha deserta, e o imperador, o único sobrevivente de um desastre aéreo, que acaba parando na ilha em que o primeiro vive.

As relações ambíguas de poder que se passam entre os dois personagens da peça é uma característica muito presente nos textos de Arrabal. Ao tempo em que um personagem assume a postura de opressor, logo na sequência pode estar subordinado à opressão do outro. Essa é uma das características que compõe o que é chamado de Teatro Pânico, teatro este sobre o qual Arrabal exerce forte influência.

Tentar explicar a peça ou refletir sobre ela pode ser um caminho perigoso, pois se trata de uma peça que, devido a sua intensidade sensitiva, tem o grande poder de deixar o espectador anestesiado. Mas, mesmo assim, vamos arriscar traduzir essas sensações e intuições que o texto provoca.

No texto, aparenta estar presente, na forma de metáfora, a própria evolução civilizatória do homem e suas contradições. Vemos no Arquiteto características do homem primitivo, que está em íntima ligação com a natureza, que ainda não se organizou em sociedade e não sistematizou códigos de conhecimento e de conduta. Sua vida é guiada pelo conhecimento intuitivo e pelo instinto.

O Imperador seria a metáfora do homem civilizado que estabeleceu leis e valores sobre as coisas e que foi se afastando do instintivo em direção ao que é racionalizado. Nele estão presentes os vícios que a vida civilizada trouxe, assim como sua forma de se relacionar com o outro e com a natureza.

Acontece que características tão antagônicas não geram conflitos na peça. Pelo contrário, elas coexistem, e de certa maneira se complementam, levando ao extremo a condição de ambiguidade nos personagens, que muitas vezes chega a ser doentia. É o humano, naqueles personagens, revelando suas contradições.

O extremo em que se mostram as situações dos dois personagens, tais como seus jogos de interpretação e seus fantasmas internos, é o que pode levar o texto a se encaixar no Teatro Pânico. Tentar entender de forma racional esse texto exige muito esforço, e com certeza um esforço em vão. É uma peça para se sentir e depois voltar para casa e tentar entender o que todas aquelas sensações querem dizer. Talvez seja isso que cause pânico. Descobrir em nós a possibilidade do absurdo humano. E mais. Um absurdo codificado.

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A dor de ser artista

Por Antônio Roberto Gerin

 Ingmar Bergman, com seu contundente filme NOITES DE CIRCO (90’), Suécia (1954), traz para a tela um dos temas que lhe é muito caro, e que viria a se repetir em vários de seus filmes, nos anos seguintes. A arte como fonte de sofrimento para o artista. E a humilhação como uma das chagas mais visíveis desse sofrimento.

Talvez esta dura realidade seja a temática mais convulsiva de um Bergman amargo e irônico que está disposto a pôr a nu as vicissitudes do seu ofício. Afinal, Bergman esteve enfiado até a alma nos palcos e nas câmeras. No teatro e no cinema. E o circo? Bem, o circo, com sua arte medieval, é outra história. O circo é a arte suja, cheirando a estábulos e a miséria. A arte rebotalha! A arte que vive da incerteza, rodeada de pulgas e de confusões amorosas. O circo pode ter lá suas noites de glórias, mas elas serão passageiras. Um dia a lona ficará rota e dos céus cairão sobre o picadeiro as chuvas e a luz das estrelas. E o que restará, então? O palhaço. Porque este, sim, atravessará os séculos. Intacto.

Albert (Âke Grönberg) é o dono do Circus Alberti e se relaciona, evidente, com sua principal estrela, Anne (Harriet Andersson). Mas a insegurança financeira, o cansaço afetivo e o esgotamento físico derrubam qualquer tentativa de manter as aparências de um casamento feliz. Ambos não suportam mais essa itinerância de misérias, com as pulgas tomando conta do leito e a desilusão roendo os sonhos.

Mas o circo tem que viajar até o próximo pouso. Os cavalos têm que puxar as carroças e levar o espetáculo para onde o público está. Enfim, é preciso, acima de tudo, manter a arte viva, mesmo que trôpega.

E o circo chega a uma cidadezinha do interior da Suécia, onde tudo, num espaço de vinte e quatros horas, acontece. E o que acontece é uma sequência de humilhações, onde Bergman, com sua ironia corrosiva, coloca na tela o que ele pensa sobre as labutas e as incertezas do ser artista. E não há dúvida, parece-nos, de que o invólucro social da arte é a humilhação.

A primeira humilhação aparece logo no início do filme, numa sequência de cenas pungentes e inesquecíveis. Alma, esposa do palhaço Theodore, toma banho nua, no mar, com os soldados que estão fazendo exercícios de tiros de canhão. Todos riem, todos se divertem. E o marido, o palhaço, é maldosamente avisado do que está acontecendo. Ele sai do circo, corre em direção ao mar e retorna, trazendo nos braços, o corpo nu da esposa. E atrás dele, um séquito de chacotas. Sua agonia é tentar proteger a esposa e a si da humilhação pública. Não consegue. Esgotado, cai sobre o corpo da mulher. E, desfalecido, é carregado pela multidão circo adentro. Silêncio! É o momento de a arte supurar as suas dores.

A arte tenta, a todo custo, esconder seu calcanhar de Aquiles, a falta de dinheiro. Mas, é impossível, pois, afinal, sem dinheiro não tem como seguir adiante. Bergman, mais do que ninguém, sabia da necessidade de se obter financiamento para prosseguir com seus projetos. É curioso perceber essa relação humilhante com o dinheiro na própria história de Bergman, um diretor mundialmente consagrado, com os dois pés fincados na indústria cinematográfica sueca, mas que, mesmo assim, se vê obrigado a financiar alguns dos seus projetos com recursos próprios.

Albert, o palhaço-mor, reflete esse cansaço na eterna e humilhante busca por dinheiro. Primeiro, ele é humilhado ao ir bater à porta de outra arte, o teatro, para implorar figurinos. Depois, o circo é humilhado em praça pública pela polícia municipal quando esta, ao ver a trupe divulgar, sem autorização, o espetáculo que iria acontecer logo mais à noite, confisca os cavalos, obrigando a que os circenses, diante de toda a cidade em risos, puxem, como animais, sua própria carroça. Depois, Albert vai se humilhar diante da ex-esposa, a quem outrora abandonara, ela que é agora uma empresária bem sucedida. Ele pede para reatarem, inclusive promete abandonar o circo, portanto, a arte, mas ela o rejeita. E, por fim, vê sua atual esposa traí-lo com a estrela do teatro local, o sedutor Frans (Hasse Ekman). E não bastasse, esse mesmo teatro vai, à noite, até o circo para humilhar Albert em seu próprio picadeiro, diante de uma plateia em delírios. Basta, não acham? Sim, chega, pois é hora de partir. O sol vai raiar, nada mais resta a Albert senão continuar se arrastando com seu circo pelos caminhos do mundo. É preciso continuar provando que a arte morre e renasce a cada instante. É assim que tem que ser. Ainda bem.

O que Bergman, afinal, pretende com tudo isto, quando coloca o circo, arte artesanal por excelência, como o tapete a ser pisado? Talvez o circo represente a penúria a que todos os artistas estão sujeitos. Por isso, nada melhor encerrarmos esse doloroso assunto, transcrevendo aqui as palavras do próprio Albert. Diz ele a um dos palhaços, Frost (o magnífico Anders Ek). “Não quero andar por aí com este lixo de circo! Quero ser um cidadão honesto, com uma conta bancária e uma esposa respeitável.” E resume. “É uma vergonha ser Albert!”. Pois é, Bergman.

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