Publicado em Categorias Resenhas, Teatro

Por Alex Ribeiro

Luar em Preto e Branco, uma peça de Lauro César Muniz, de 1992, conta a história de Antônio, um senhor de oitenta anos que, na sua juventude, sonhou em construir e manter o maior cinema do interior do Brasil.

Antônio era um jovem de classe média, promissor nos negócios de algodão, mas que se viu arrebatado pelo sonho de construir um belo e grande cinema na sua pequena cidade do interior de São Paulo. Ele arrisca tudo, seu dinheiro, posses da sua esposa, e até mesmo abandona suas vendas de algodão para cuidar da construção do seu cinema.

Anos mais tarde, quando Antônio já está velho, vê o prédio que outrora abrigara seu sonho ser transformado em uma grande loja de móveis. Antônio, certo de que vai morrer em breve, resolve querer comprar o cinema com o dinheiro do seu seguro de vida e dá-lo aos seus filhos e esposa, para que possam reabrir o cinema, seu grande sonho, que ainda persistia em seu peito.

Parece que Lauro César trouxe ao palco um personagem muito parecido, nos sonhos de classe média, com o caixeiro viajante, criado por Arhur Miller. As sensações de fracasso e tristeza profundos são um golpe forte no espectador. Talvez possamos olhar para os reflexos das nossas frustrações em função do que tem acontecido no Brasil, hoje em dia. Presenciando os inimagináveis desdobramentos políticos e sociais pelos quais o Brasil está passando, posamos chegar tristemente à conclusão de que não era bem isso que imaginávamos para nós mesmos. E como um triste personagem, poderíamos lançar a pergunta: seríamos uma nação onde o sonho morreu? Afinal, Brasil, qual é o seu sonho?

Clique aqui para conhecer os textos teatrais de Antônio Roberto Gerin, dramaturgo da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto.

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Por Alex Ribeiro

“Quem com ferro fere
Com ferro será ferido”
Na terra dos poetas é diferente
Lá se vai mais fundo na alma da gente

Se te beijo com os olhos
Se te conheço com os lábios
Se a pele arrepia ao som da tua voz
O peito delata o suspiro desses nós

Se minha companhia te basta
Se meu beijo quente é libido
Se meu toque calmo é preciso
Ou se só a presença já é suficiente
Ah, não te acanhes
Venha pro aconchego dos meus versos
Pois, se com amor tu te ofereces
Com amor serás recebida.

Publicado em Categorias Resenhas, Teatro

Por Alex Ribeiro

A Visita da Velha Senhora é uma peça de Friedrich Dürrenmatt, que teve sua estreia no final da década de 1950. É considerada a obra prima do autor, apesar de receber algumas críticas em relação à construção das personagens, principalmente por elas serem rasas demais, sem camadas humanas e dramáticas, características estas presentes nas grandes personagens do universo teatral. Dürrenmatt parece ter encontrado os contornos precisos para compor um conjunto de elementos que fizeram com que sua obra ganhasse a dimensão que merecia. Se por um lado conhecemos pouco das características das personagens de A Visita da Velha Senhora, quando afastamos a lupa podemos perceber toda uma engrenagem desenhando um complexo quadro social. É a partir desse quadro que a obra de Dürrenmatt mostra toda sua grandeza. Ele revela como podem ser devastadoras as pequenas ações, a covardia que mantém seguro o pacto social, e o mais escandaloso desejo de poder e vingança, apresentado ora de maneira crua, na personagem da velha senhora, ora de maneira sutil, nos pequenos moradores da cidade de Gullen. Poderíamos dizer que A Visita da Velha Senhora seria uma peça que trata da vingança? Ou de ambição e covardia? A verdade é que a união das duas coisas é que faz girar a engrenagem da tragédia. E o pano de fundo? Uma moral frouxa, que aceita qualquer tipo de distorção, desde que sirva aos interesses  dos cidadãos de Gullen.

Quando jovem, Clarie, nossa protagonista e hoje velha senhora, se viu perdidamente apaixonada por Alfred Schill.  A sua paixão pelo rapaz viria a lhe custar caro, quando, no momento em que ficara grávida dele, foi humilhada em público e expulsa da cidade. Desamparada no exílio, e depois afastada da filha, Clarie foi obrigada a viver como prostituta, onde conheceu um bilionário, dono de várias companhias multinacionais, com o qual se casou e herdou um poderoso império no ramo do petróleo.

Agora, de volta à Gullen, encontra uma cidade arrasada pela miséria. O povo da cidade vê na visita de Clarie uma possibilidade de se livrar da situação de calamidade em que se encontra. Bastaria amolecer o coração da saudosa Clarinha. Mas essa não é a intenção da velha senhora. Ela tem um outro objetivo. Impõe uma condição para que a cidade receba uma ajuda bilionária. Alfred Schill precisa ser morto, para que a injustiça causada no passado seja remediada.

A cidade acha absurda a proposta, se nega a aceitá-la e declara apoio a Schill, homem querido por toda Gullen. Porém, fenômenos começam a perturbar os habitantes da cidade. Antes acostumados a viver com poucos recursos, as pessoas de Gullen começam a gastar muito, a comprar muito, e, mesmo negando que aceitariam a proposta de Clarie, vai ficando claro que, mais cedo ou mais tarde, alguém irá matar Schill. Até mesmo a família de Alfred parece só aguardar que alguém dê cabo dele, esposo e pai, para que a vida possa, enfim, melhorar.

O clima tenso é levado a altíssimas proporções, e a tortura emocional a que Schill é submetido é impressionante. É assim que se faz justiça? A figura de uma pantera caminha pela cidade oferecendo perigo aos moradores e, por isso, precisa ser abatida. É uma bela metáfora da situação em que se encontra Schill. Clarie tem a tranquilidade e a certeza de que a sua Gullen não vai deixar de cumprir a sua vingança. Ela tem apenas que deixar que seus conterrâneos não resistam ao dinheiro oferecido. Clarie tem certeza de que o dinheiro pode comprar tudo.

Há, em A Visita da Velha Senhora, vários pontos que podemos utilizar para refletir sobre nós mesmos. Talvez seja significativo olharmos para os valores que trazemos conosco e acabam por reger uma espécie de código de leis próprios, adaptados aos nossos desejos, e afastados das leis estabelecidas. Nossa própria moral? Esse código à parte, aliado da expressão bons costumes, sempre que analisado de perto, revela suas perversões. É claro que as leis se estabelecem para conter os impulsos destrutivos que podem comprometer nosso convívio em sociedade. Mas, basta que a oportunidade de poder se ofereça, para que esse conceito seja jogado por terra. Seja num bilhão colocado à mesa, num holofote da grande mídia que desenha um certo prestígio, ou na disseminação de mentiras, falsas ideias e notícias, para percebermos que a distorção da lei é um prazer, mesmo que perverso. E eis aqui, caros leitores, mais uma vez, o teatro cumprindo um importante papel social. O de refletir e questionar. Daí em diante, passa a ser nossa a responsabilidade pela mudança. De nós mesmos.

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